terça-feira, 7 de abril de 2015

Um Pouco das Palestras - 3° Sessão

Na terceira sessão do seminário, cujo tema foi Gênese e Institucionalização do Estado, contamos com a presença dos professores Roberta Manuela Barros, José Vicente Tavares e Luiz Fábio Silva Paiva.

Roberta Manuela Barros

Na sua intervenção, Manuela Barros enfatizou a importância da reflexão metodológica de Bourdieu no seu projeto de reconstrução da sociogênese do Estado moderno. Lembrando a modéstia como característica importante no trabalho do sociólogo, ela citou Bourdieu: “O grande sociólogo não é aquele que trata dos grandes problemas, mas aquele que converte os pequenos problemas em uma grande reflexão.” É neste sentido que Bourdieu convida a pensar o Estado “pequeno” que se infiltra em nós. Influenciado por Durkheim, Weber, Mannheim e Bachelard, Bourdieu propõe uma concepção da Sociologia como uma ciência do “desvelamento do real”. Diante disto, tratar sociologicamente o Estado, segundo Bourdieu, consiste em “descortinar” a amnésia da gênese da instituição, ou seja, desvelar o arbitrário dos começos. Ao adotar a vigilância epistemológica preconizada por Bachelard, Bourdieu considera a desconfiança sistemática face às adesões (deformações ideológicas) e aderências (mediadoras de prenoções) como uma estratégia imprescindível ao estudo sociológico do Estado.

José Vicente Tavares

Prolongando a apropriação teórica da professora Manuela Barros, José Vicente Tavares iniciou sua palestra ressaltando a tácita aceitação dos “dominados” no exercício da violência simbólica. De fato, esta problemática atravessa toda a obra de Bourdieu, mediante um permanente esforço de superação das oposições entre as dimensões micro e macro da análise sociológica. Tal esforço indica um diálogo implícito com Michel Foucault, apesar de, em seus cursos sobre o Estado, Bourdieu ter ignorado as reflexões deste filósofo acerca da governamentalidade. Por isso, o professor José Vicente alertou que para entender a gênese do Estado, não basta ler Bourdieu. Porém, cabe destacar a contribuição importante do sociólogo que critica Elias e Weber por não terem esclarecido quem são os agentes do Estado que possuem o poder do monopólio. A fim de esclarecer esta questão, Bourdieu define quatro perguntas fundamentais: Quem tem interesse no Estado? Há interesse em universalizar? Quem é o portador desse interesse? Quem detém o monopólio dos monopólios? A imagem do Estado como campo dos campos remete-nos à teoria bourdieusiana dos campos de ação social que, como observou o palesrante, busca reconhecer a pluralidade do mundo social. Mesmo que Bourdieu não cite Alain Tourraine1, a interpretação do conceito de campo em termos de lutas foi certamente inspirada em suas análises. Por fim, o professor José Vicente evocou um terceiro Bourdieu que, na última fase de sua carreira, aproximou-se de certo “utopismo racional”, cuja base se encontra no uso ético de uma sociologia reflexiva, dá mostras de comprometimento com a transformação social.

Luiz Fábio Silva Paiva

Por sua vez, o professor Luiz Fábio Silva chamou a atenção do público para o fato que trabalhar com a sociologia de Bourdieu significa também, em certo momento, ser capaz de deixar Bourdieu de lado. Dito isto, o professor apresentou “Sobre o Estado” como um texto no qual Bourdieu mobiliza seus conceitos teóricos mais para interpretar o Estado, do que para fazer uma reflexão sobre o Estado. A questão central à qual Bourdieu tenta responder é: como é possível que se obedeça ao Estado? A explicação desta aceitação aparentemente dócil encontra-se no conceito de violência simbólica, ligado ao senso prático. Na linha dos escritos de Durkheim, Bourdieu contesta a visão a qual sugere que a coerção seja uma imposição autoritária. Pelo contrário, trata-se de um processo de interiorização da dominação que faz com que não sintamos esta imposição. Portanto, Bourdieu acusa os sociólogos que perdem tempo querendo encontrar as origens da sujeição para chegar à prova final, ao invés de pensar o como se configurou este fenômeno. Bourdieu retoma também a ideia de Marx de uma dominação que não se faz somente pela força, mas que precisa universalizar um ideal de classe convertendo-o em ideal universal. Assumindo uma posição crítica face ao Estado, Bourdieu insiste sobre a necessidade de repensar as dominações a partir do estudo das posições dos indivíduos na sociedade.


1 Alain Touraine, Sociologie de l'action, Paris, Éditions du Seuil, 1965 et Critique de la modernité, Paris, Fayard, 1992. [Obras disponíveis online em francês http://classiques.uqac.ca/contemporains/touraine_alain/touraine_alain.html ]

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